sábado, 29 de dezembro de 2018

A Peleja do capeta para vencer a eleição no Brasil

#1

O diabo esse capeta
Fica no inferno a tramar
Maquinando em sua veneta
Tudo que vai aprontar
Não passa um dia corrido
Que o tinhoso não invente
Uma maldade diferente
Pra  bater do povo sofrido
Essa é a função do coisa-ruim
Que ele fique longe de mim

#2

Um dia o Tinhoso pensou
Olhando pro mapa do mundo
A  maldade imaginou
E fez o plano num segundo
Num grande país lá do sul
Logo  vai ter eleição
Vou trazer a submissão
Pra esse país de céu azul
E o Demo traçou os seus planos
Para governar por muitos anos

#3

Lá de cima sabendo de tudo
Observava o todo poderoso
Vigiava de longe o chifrudo
Controlava o presunçoso
Deixa-lo solto resolveu
Em sua sabedoria
Como ele tudo sabia
Esperou e aquiesceu
E disse o onipotente
Deixa o diabo que aguente

#4

E assim o Cramunhão
Levou a ideia adiante
Pra ganhar a eleição
E se tornar presidente
Em sua cabeça soturna
Faria de tudo um pouco
Para deixar o povo louco
E ter a vitória na urna
Seu plano estava traçado
E povo estava lascado

#5

O seu plano de governo
Traçou o Belzebu
Dar dinheiro para os ricos
Os pobres que tomem pitu
Pra que escola para pobre?
Se pobre não entende nada
Vou usa-los como escada
E fiquem só com o que sobre
Era traçado o plano macabro
Para espalhar o escalabro

#6

Estando os planos concluídos
O Maligno veio pra terra
Trouxe os anjos caídos
Pra ajudar na sua guerra
Veio de jatinho particular
Como um político normal
Fez chegada  triunfal
Para a eleição disputar
Todo pomposo chegou
E a imprensa toda noticiou

#7

Chegando aqui o Tinhoso
Logo foi procurar
Contato com poderoso
Que pudesse lhe ajudar
Era governador e prefeito
Empresário de todo lado
Senador e deputado
Político de tudo que é jeito
Cheio de perversidade
Juntou a trupe da maldade

#8

A campanha começou
Só mentira espalhando
Whatsapp disparou
Facebook detonando
Fazia tanto discurso
Todo mundo enganando
E o povo acreditando
Naquele abraço de urso
Nas pesquisas ia subindo
E ele satisfeito só rindo

#9

No dia da eleição
O sete-peles foi sentar
Na frente da televisão
Certo que ia ganhar
Esperou a apuração
Mas o peste do chifrudo
Foi ficando amuado
Conforme via o resultado
Da soma daquilo tudo
Confiou demais na sorte
Perdeu até o rumo do norte

#10

Satã não sabia ao certo
Que no sul do equador
Tem político muito esperto
Malandro e enganador
Confiou o Satanás
Em político safado
Deixaram ele de lado
Passaram o Demo pra trás
Mas o Tinhoso ainda faz mistério
Quem sabe vem um ministério...

db (12/2018)
Estava à toa na vida
E conheci Djanira
Djanira das cores
Das múltiplas dores
Dos pés de café
Djanira de Avaré
Dos anjos Djanira
Da força e da fé
Que a vida não tira
De Santa Tereza
De lá para o mundo
De tanta beleza
Simplicidade singeleza
Num olhar profundo
Estava à toa na vida
E Djanira conheci
Das tintas das telas
Das santas mais belas
E me enterneci

db


terça-feira, 4 de dezembro de 2018

- Quanto custa a sua poesia?
- Não sei. Quanto vale o seu sentimento?
db
Ainda bem que tenho a poesia
para encher meu peito vazio.
db

Vida

Vida
A vida é assim
um recorde
Um recorte
de revisa antiga
rasgado à mão
Meio puído
meio apagado
Guardado dentro
de um livro
que foi lido e
esquecido
há muito tempo
numa estante velha
Um belo dia
você procurando
outro encontra aquele
E aí é bom ter
uma garrafa
e um maço de
cigarros
à disposição...
db

Tira esse ódio do peito

I
Meu Brasil tá dividido
Numa briga sem cessar
Todo mundo tá perdido
Tem muito ódio no ar
Ninguém presa o pensamento
Ninguém mais se entende
Só sua verdade defende
E faz escolha de jumento
É melhor pensar direito
Tira esse ódio no peito
II
É difícil a resposta
Não tem muita opção
De um você não gosta
O outro você acha ladrão
Priorize só o bem
Para o melhor da nação
Examine o seu coração
Não vá na onda de ninguém
É melhor pensar direito
Tira esse ódio no peito
III
Tenho certeza de nada
Nem meu voto tá selado
Mas o que levou a facada
Esse já deixei de lado
Não fique bravo comigo
Não gosto de violência
Amizade é uma ciência
Eu continuo seu amigo
É melhor pensar direito
Tira esse ódio do peito
IV
Esse candidato citado
Nem o nome vou falar
É sujeito alterado
Vive falando em matar
Esse tal de capitão
Sem nenhuma compostura
Lembra muito a ditadura
Por isso eu digo #EleNão
É melhor pensar direito
Tira esse ódio do peito
db

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Era proibido proibir

Houve tempo em que era
Proibido proibir
E a liberdade era livre
E você podia sem medo
de ser feliz ser feliz
E os muros caiam
Os beijos rolavam
E tomar chuva era da lei
Atirar pedra na vidraça
Não só era permitido
Como necessário
Tocar campainha e sair
correndo era aventura
A madrugada era
Sempre criança
Criança sem limites
Sem mimo e
Sem chiliques
O vento era livre
para bater na cara
O sol era livre
para queimar as costas
E o mundo era tão
pequeno que não
conhecia distância
Nada era longe demais
Era proibido não falar
Sobre censura
Porque proibir era proibido
E a porta ficava sempre aberta
A mente ficava sempre alerta
Porque pensar era permitido
Era proibido proibir pensar
E você podia sair com amigos
E falar sobre o som que rolava
Que era novo revolucionário
Porque o novo não era proibido
Permitia-se discordar
Aceita-se concordar
Só não podia não poder
Só não podia não viver
Só não podia não criar
Por que naquele tempo
Era proibido proibir

db (11/2018)

terça-feira, 2 de outubro de 2018

O Monstro

Naquela casa assombrada
Tinha um monstro assustador
Toda a gente ficava assustada
Porque o monstro tocava o terror
Sempre que a tarde caia
O monstro se preparava
Era uma correria brava
Quando o monstrengo saia
Tinha gente que chorava
Tinha gente que sofria
Todo mundo tinha medo
Menos a menina Sofia.

O monstro era enorme
Maior do que essa porta
Tinha um rosto disforme
E uma das pernas torta
Na cara um olho só
Seu focinho era de porco
O dente era todo torto
Era feio que dava dó
Tinha quem se fingia de morto
Tinha gente que fugia
Todo mundo tinha medo
Menos a menina Sofia.

Numa tarde de verão
Quando o monstro saia
Ele deu um encontrão
Deu de cara com Sofia
Ela não teve medo da fera
E uma conversa rolou
Imagine que daí resultou
Uma amizade sincera]

Que amava poesia ele contou
Ela declamou as que sabia
Por isso todo mundo tinha medo
Menos a menina Sofia.

db e Sofia Bunder (outubro/2018)

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Flertando com Sartre

Quando nasce é só existência
E cresce egoísmo e manipulação
Assume assim esta essência
Com escolhas feitas à mão
Condenado à liberdade
Escolhe só o mais útil
Esconde-se da verdade
E leva uma vida fútil
Esquece-se que no futuro
Suas escolhas terão um preço
Um preço pago em ouro puro
Com solidão e falta de apreço
Se é livre para escolher
É livre também para mudar
E os revezes que sofrer
O podem fazer escutar
A essência continua
Mas controla-la é possível
Deixar sua alma nua
E tentar crer no incrível
A procura é urgente
Achar no porto um cais
Decepar esta serpente
Antes que seja tarde demais

db (agosto/2018)

Marreteiro de sua arte

Paulista de domingo
De mil artes e sons
Passo na calçada do Masp
Onde em meio ao burburinho
De manifestações por
Assassinatos não resolvidos
Hippies vendendo
Pulseiras colares e janelas dos sonhos
Barracas de antiguidades amareladas
Artistas plásticos com seus quadros no chão
E um mar de gente olhando tudo
Encontro um companheiro
De escrevinhação
Mascateando seu livro
(Lá no vão do Masp
Vive uma horda desses
Escritores que andam sempre
Com uma bolsa tiracolo
E um par de exemplares na mão
Tenho inveja deles)
Com um discurso pronto
Oferece seu peixe
Desinibido e mecânico
Mostra a sua foto na contracapa
E se compara a Shakespeare
Como narrador antigo de futebol
Conta em segundos uma história
De como o revisor queimou
O livro supimpa mas
Não é de todo culpado
Não me deixa falar
E manda o preço de 20 mangos
Penso no que seria ele
Nas horas em que não é autor
Das suas histórias
E marreteiro dos seus livros
Corretor de imóveis, contador,
Funcionário público, bancário?
Imagino suas esposas e filhos
Perguntando quando ele
Irá ganhar dinheiro com isso
Seus irmãos, primos e cunhados
Falando à boca pequena
Que ele é um sonhador ou vagabundo
Aí lembro-me que Bukowski foi
Funcionário dos correios a vida inteira
E nunca deixou de escrever
Me convenceu
Compro seu livro
Os do velho safado (Bukowski)
E do marreteiro de sua arte.
db (08/2018)

O que eu quero

Quero o poder de uma poesia sentida que faça respirar
Quero o norte de uma palavra forte que me de inspiração
Quero o afago de um silêncio longo que me tranquilize
Um chamado de um amigo que peça ajuda
E o contato de um outro que me traga saudade
Quero conversas animadas sobre nada importante
Que essas conversas sejam sobre o sentido da vida
E que esse assunto seja o que mais importa
Quero tentar entender as verdades alheias
E sempre por em dúvida as minhas verdades
Quero que as esquinas da minha cidade me quebrem
E quero que os viadutos dela me desabem
Quero que toda rua dela seja um palco
Quero que a cidade inteira seja poesia
Não quero matar meus demônios
Mas quero que eles sejam domesticados
Quero que minha essência sejam minhas escolhas
E que eu me orgulhe delas mesmo que deem em nada
Quero um mar de água salgada no canto dos meus olhos
E que esse mar transborde sempre que chova emoção
db (08/2018)

quinta-feira, 5 de julho de 2018

Dos tantos que fui

Dos tantos que fui
Muitos perdi
Alguns eu não sei
Outros nem vi
Uns só lembrança
Outros pedaços
Retratos do tempo
Beijos e abraços
Memórias puídas
De tempos passados
Entradas saídas
perdas e achados
Já fui rua já fui terra
Já fui mar e explosão
Já fui lua já fui guerra
E também solidão
Se cresci não notei
Devo ter esquecido
Se morri eu não sei
Passou desapercebido
Fui traído e traí
Já prestei atenção
Já me abistraí
Já revelei já menti
Já fugi já voltei
Nunca me encontrei
Já corri contra o vento
Nadei em água fria
Já toquei instrumento
Estudei filosofia
Já cai machuquei
Levantei e chorei
Do que já acabou
Ainda estou no começo
Dos tantos que sou
muitos ainda nem conheço

db (julho/18)

quinta-feira, 21 de junho de 2018

No tempo que eu sabia tudo

No tempo em que eu sabia tudo
havia uma floresta no quintal
Tinha monstros, animais ferozes
e inimigos de filme de cinema
Eu os vencia com uma espada
feita com galho de árvore
Era o tempo em que eu vencia tudo
Lá também havia um poço encantado
Nele tinha água clarinha e era tão
fundo que para alcança-la
a gente usava uma corda infinita
com um balde na ponta
Era o tempo em que eu podia tudo
Também havia uma eguinha
Muito negra e brilhante que
levava leite para todos na cidade
Ela puxava uma carroça que eu
guiava com maestria porque
era o tempo em que eu sabia tudo
Nesse tempo eu também podia tudo
E comia quantos torrões de açúcar quisesse
Rapadura, doce de coração, bala de côco
Comia até doer a barriga
Depois eu tomava água do poço
encantado e tudo fica bem
Era o tempo em que eu vencia e sabia tudo
Agora eu acredito que não saiba nada
E o sentido de vencer mudou
A pesar de ter passado muitos anos
eu ainda vivo lá com a égua Negrinha
e com o poço encantado no quintal
Mas a espada de galho de árvore
que eu usava para vencer os monstros
hoje eu transformei em poesia
db (junho/2018)

sexta-feira, 11 de maio de 2018

Eu preciso escrever sobre o vento

É preciso escrever sobre o vento
Apesar de tudo é o vento que importa
Dane-se o mar, a montanha, o tempo 
Lasque-se as agruras da vida torta
Os tropeços que o destino apresenta
Os problemas que batem à porta
É preciso escrever sobre o vento
Sobre os caminhos que ele percorre
As tristezas que ele alimenta
Os buracos onde ele morre
É preciso entender o peso do vento
E perceber a leveza do ar
Assim a qualquer momento
O vento pode te fazer voar.
db

segunda-feira, 7 de maio de 2018

Insanos

E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música
E foram condenados, levados a calabouços e tomaram choques elétricos
Queriam convence-los de que não havia música e que estavam em delírio
- Como vocês podem subverter a ordem estabelecida e
dançar assim felizes enquanto o mundo segue triste no silêncio?
E foram torturados e colocados no pau de arara e foram estuprados e humilhados
Mas continuavam ouvindo e não tinham o controle de seus corpos
Mesmo amarrados e machucados continuavam a mexer seus corpos no ritmo da música
E apanhavam mais e eram mais humilhados e tomam mais choques elétricos
Alguns ficaram surdos, foram lobotomizados e nunca mais dançaram
Se recolheram em um soturno mundo sem som e alegria
Outros, mesmo mutilados, nunca deixaram de ouvir
E continuaram dançando e rodando e em seus olhos havia um estranho brilho cheio de alegria
E continuaram sempre sendo julgados insanos pelos que não ouviam a música
Seguiram incomodando à todos os surdos do mundo e evitados pelos que tem medo de ouvir.
db
(com a colaboração de Nietzsche)

Outono

Sem sol nem sombra
Sem sal e sem açucar
Nem doce nem amargo
As folhas caíram
Eu ainda nem falei delas
Nem o cheiro senti
Não fiquei descalço para pisar nelas
Não senti a umidade
Nem me emocionei para poder
Contar o cheiro que elas tem
Nem o dia de sol
Nem o friozinho do fim da tarde
Foram o suficientes
Para preencher o papel
Não falo o que é
Não sei do que se trata
Nem sei o que dizer
Só uma melancolia
ronda o peito
que se enche de vazio
Será que o outono é assim?
Será que eu sou assim no outono?
db

Grito mudo

O peso que
se carrega
nos ombros
nem sempre é maior
que a pressão
que aperta o peito
A voz que não
se ouve
Nem sempre é
tão surda
que não se perceba
O grito que não
se solta
nem sempre
é tão mudo
que não se
faça ouvir
db

segunda-feira, 9 de abril de 2018

Vozes


Vestiu a camisa remendada
e a única calça que estava
dobrada dentro da caixa 
velha e amassada de papelão
Calçou os chinelos. Penteou
o cabelo com o pente de plástico
amarelo que estava no
bolso da calça olhando
para o espelho pendurado
na parede sem se reconhecer
Olhou os companheiros
ainda dormindo nas outras
camas do quarto
Pegou a carteira surrada,
conferiu os documentos,
respirou fundo e controlou
a lágrima do canto do olho
que teimava em escorrer
Imaginou o que diria na
despedida para os funcionários
do sanatório, treinou mentalmente
as palavras, com medo que
descobrissem que ainda
não era são e que aquelas
vozes, por hora sob controle,
ainda o perseguiam
Com medo de que percebessem
sua insegurança repetiu as palavras
com todo o cuidado
Seguiu em direção à porta que
já estava aberta, parou, olhou
mais uma vez para o quarto
como que num último adeus
Fechou a porta atrás de si e
seguiu para o grande portão
que dava para a rua
olhando para os muros
com pintura velha e frases
desconexas pixadas
Já no pátio, puxou de dentro do
saco plástico que levava seus
pertences um maço de cigarros
Pediu fogo ao guarda da saída que
lhe deu uma caixa de fósforos
Acendeu o cigarro puxando com
força a fumaça e a segurando
no peito longamente
O guarda olhando fixamente para
seus olhos lhe falou:
"Boa sorte, você não é mais louco"
Ele estremeceu.Tinha esquecido
as palavras tão incansavelmente
ensaiadas
Se afastou sem responder e após
alguns passos em direção à rua parou,
fechou os olhos e ouviu novamente
aquela voz
A mesma voz que por tantos
anos o tinha atormentado desta vez
o orientou na resposta
Virou vagarosamente para o guarda
e disse em voz alta:
"O homem que pensa não ser louco
vive em eterna ilusão"
Disse e seguiu seu caminho
Confuso, o guarda o acompanhou
com o olhar até que ele virasse
a primeira esquina, entrou novamente
e nunca mais esqueceu essa frase
db (abril/18)

quarta-feira, 28 de março de 2018

Sr. Smith

É domingo. Tarde de sol ardido na Paulista.
Muita gente e muito barulho, músicos, bandas
e DJs disputando o espaço físico e sonoro com
consequências danosas aos ouvidos de quem
tem que ficar no mesmo lugar das 5 da manhã
às 6 da tarde. Mas vale tudo pela arte
(Não, não é quase tudo. É tudo mesmo!)
A banca de poesia lá, estrategicamente montada
na sombra de uma grande árvore e eu ali,
distribuindo poesia para quem se dispõe a aceitar.
Entre uma música dançante dos anos 80 do DJ ao
Lado um blues do Cream de uma banda do outro
lado da rua e o som maneiro do Kaká Morais cantando
Nei Matogrossso mais a frente, chega o Sr Smith
em nossa banca. Um pequeno bag de instrumento
nas costas, talvez um violino ou um banjo, pela
roupa e estilo dificilmente seria um cavaquinho.
Usava uma jaqueta jeans com vários escudos
costurados, barba curta e um irresistível e pesado
sotaque americano.
Poesia se vende conversando, então apresentei
meu trabalho: Poesias grátis, poesia no azulejo,
brochuras com poesias, outras com prosa poética
de histórias da Paulista.
Foi logo falando que era americano e que estava
fugindo do Trump. Queria troca-lo pelo
Temer mas nenhum brasileiro aceitava!
Depois de olhar as peças perguntou:
- Por que as brasileiros não colam essas obras
na parede deles? Ficam colando pôster de Mick
Jagger, aquele cara feio!
Eu só sorri!
Olhou uma peça em azulejo chamada
“E Deus, que quem criou?”
Disse:
- Tem uma autor inglês, do qual não me lembrar
o nome - daqui cinco minutos, quando não fizer
diferença, eu lembra - que diz que o homem cria
os deuses quando precisa deles, depois, quando
não faz mais diferença ele os abandona. Então esses
deuses ficam vivendo numa mundo paralela,
nos assombrando. Acho que se criou deus tem
que usar!
Deu mais uma olhadinha para mim, sorriu e foi
embora.
Eu pensei comigo:
Nunca criei deus nenhum, não tenho nenhum
para usar e nem uso os que outros criaram.
Mas não tenho nenhum problema em dizer que se
você criou ou crê nos seus, pode usar sem pudor.
Obrigado Sr Smith, mas quem é mesmo esse autor inglês?
Fiquei curioso (se alguém souber me avisa).
db (21/03/2018)

quarta-feira, 14 de março de 2018

Sobre religião e loucura

Imagine uma única pessoa,
na rua,
pregando a devoção à um velho boneco de plástico.
Ele anda entoando cânticos de adoração.
Faz reverências ao boneco, se curva diante dele e tenta convencer todos a fazer o mesmo. 
Jura que ele é o salvador e o único a ser seguido.
Levanta o boneco ao alto e o mostra, com orgulho.
Diz que quem não adorá-lo será queimado vivo.
A pessoa incomoda, é taxada de louco e é enviada, pelas autoridades para um manicômio.
Imagine muitas pessoas,
na rua,
pregando devoção à uma velha imagem de barro.
Eles andam entoando cânticos de adoração.
Fazem reverências à imagem, se curvam diante dela e tentam convencer todos a fazer o mesmo.
Juram que ela é o Salvador e o único a ser seguido.
Levantam a imagem ao alto e mostram, com orgulho.
Dizem que quem não adorá-lo arderá no fogo do inferno.
Aceitas como pessoas boas e sensatas voltam tranquilas para casa.
Será a loucura apenas a religião de uma pessoa só?
db (03/2018)
(obrigado Pirsig)

Um Jab

Um jab 
Dilacerou meu
Supercílio 
E ensinou
Que ninguém vive
A experiência alheia
Um joelho ralado
Com sangue escorrendo
Pela canela
Avisou a hora
De ficar calado
A contagem do juiz
Que eu ouvi baixinho e
de longe (até 10)
Fez entender
Que há tempo de
Brigar e há tempo
de se recolher
É hora do curativo
Mercúrio e esparadrapo
É hora de esperar sarar
Os hematomas
E quem sabe
Dar a mão
Depois
Para os que ainda
Não aprenderam
Apesar da luta
db (03/2018)

terça-feira, 13 de março de 2018

Até o fim


Até o último grito
O último suspiro
O último sussurro
O último berro
O último tiro
O último atrito
Até o derradeiro pedido
O finalmente perdido
O tristemente esquecido
O loucamente iludido
Até que o pé se machuque
Que o joelho fraqueje
Que as costas se arquem
Que a lembrança se apaque
Até que gelo derreta
Que fogo se acabe
Que a ilusão feneça
Que se perca a cabeça
Até que o fim aconteça
Até que não reste mais nada
Depois da curva da estrada
ou no fim da picada
Até que dia não haja
Que a noite se esconda
Que a tarde se leve
Que a manhã anoiteça
Ainda assim
Mesmo que no improviso
Por você e por mim
Continuar é preciso
db (20/02/18)
para Fernanda

Idolatrando a dúvida

Tento respeitar a todos. Os próximos, os distantes e incluo aqueles que tem idéias divergentes da minha.
Admiro mais alguns, é certo, mas torço para que todos eles domem seus demônios assim como luto para domar os meus.
(Todo mundo tem um demônio dentro de si)
Observo que alguns, mesmo inconscientemente, fazem mal a outros, as vezes na certeza de ajudar, as vezes por serem dominados pelo egoismo. Desejo que tentem se entender e se entendendo sejam melhores. Temo por aqueles que são atingidos pelo mal destes e não têm como se defender.
O mal inconsciente é pior que o mal proposital, contra este é mais fácil lutar pois é aparente. Já aquele deixa à deriva a compreensão. Ele acontece sem ser percebido por quem faz, mas atinge com a mesma intensidade a quem recebe.
Penso que a certeza de estar certo muitas vezes é a origem do mal, então idolatro a incerteza na esperança de que a dúvida me oriente.

db

Amigo paralelepípedo


Quando eu era criança
Eu tinha um paralelepípedo
De estimação
Era desses comuns
Que usavam para calçar
As ruas no interior
Por ser paralelepípedo
Tinha seis lados
Cor de pedra
E uma personalidade dura
Eu tinha muito asseio com ele
Lavava com água e
sabão todos os dias
Ele tinha nome, mas não
Passeava comigo
(talvez pelo peso)
Amigos humanos eram raros
Por isso era ele quem ouvia
Minhas histórias
E guardava meus segredos
Companheiro fiel, nunca contou
Nenhum deles a ninguém
Ele sabia de tudo e
Eu nunca soube nada dele
Introspectivo, calado
Ficava ali, só ouvindo
Quantas vezes hoje
A gente deseja
Um amigo que só nos ouça
Não diga nada e guarde
Nossos segredos?
Um paralelepípedo
As vezes faz falta
Você acha estranho
Ter um amigo paralelepípedo?
Então talvez você tenha
Esquecido como é ser criança
Ou talvez tenha tido mais
Amigos humanos que eu.
db

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

O mar não está para peixes

Não há escolha
É tocar o barco
Negociar com o vento
Estancar a sangria
Com o torniquete d'alma
Soltar as velas
E se entender com o leme
Fazer acordo com a maré
Sentir a brisa na rosto
Respirar mais uma vez
O mar é dono do destino 
E não está para peixes
A navegação da vida
Exige calma e paciência
E não há carta náutica
Que ensine o exato caminho
db

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Egrégora de dois na Paulista

Adoro quando japoneses
param na minha banca
de poesia na paulista.
Adoro pela sua falsa
simplicidade, pela sua
suposta timidez, pela
sua fala baixa.
Eles chegam em silêncio
com a cabeça baixa,
compenetrados.
E quando se interessam,
olham com aquele sorriso
discreto, que diminui ainda
mais os olhos pequenos.
Os mais velhos destilam
mansamente uma
sabedoria de vida e de
tradição que sempre
me encanta.
Os mais novos também
tem um DNA de sabedoria
que me intriga.
As mulheres orientais,
especialmente as japonesas
e descendentes têm alguma
força que não se encontra
em manuais ocidentais.
Talvez um passado atômico,
talvez uma experiência milenar
ou tudo junto tenha
feito dessas mulheres
pessoas especiais.
Domingo uma dessas
mulheres especiais
passou por lá.
Uma senhora, pequena
e magra, vestida com roupas
esportivas ocidentais que só os
orientais mais velhos usam
para passear.
Perguntou silenciosamente,
sem uma palavra, apenas
com um gesto, se poderia
ler as poesias que
distribuo de graça.
Eu, ocidental acidentado,
pouco afeito à delicadeza
de um gesto, quebrei o
encanto do silêncio e falei
que ela ficasse à vontade.
Eram dezenas de poesias
na caixinha de madeira.
Ela, em pé, ia lendo uma
a uma e após ler, empilhava
cuidadosamente o papel lido
no cantinho da caixa.
Eu observava apreensivo.
Sempre fico apreensivo
quando leem minhas poesias,
mas com ela minha costumeira
insegurança era maior,
silenciosamente eu ansiava pela
sua aprovação.
Aquela pequena senhora oriental
ali na rua naquele momento, era
muito maior que eu.
Vez por outra ela respirava fundo
ao terminar a leitura de uma poesia.
Teria gostado?
Teria se decepcionado?
E foi lendo sem pressa,
separava algumas em
um outro ponto da caixa.
De repente, ela levantou os olhos
para mim e disse:
- Todas suas?
Eu disse sim com a cabeça
(um gesto meu finalmente)
- Que inspiração!
Eu respirei aliviado, ela continuou
usas leituras e eu fiquei observando.
Notei que ela não lia algumas
até o final e ela teve ter
percebido que notei por
telepatia pois logo em seguida
me explicou baixinho:
- Só leio até o fim se o assunto
me interessa.
Voltou a ler.
Sem tirar os olhos do papel,
como que com vergonha,
ela começou a me contar
que também escrevia
Disse que tinha participado
de um concurso de poesias
cujo tema era escravidão
e que todos escreveram sobre
um lugar chamado Palmares e
um homem chamado Zumbi.
Coisas das quais ela nunca
havia ouvido.
A poesia dela, que foi premiada,
falava de um despertador que
quando tocava era como uma
chibata que estalava e ardia
nas suas costas e a fazia levantar
e trabalhar todos os dias da vida.
Contou que sua alforria só veio
quando começou a escrever poesia.
Ao final da leitura de todas
ela separou duas.
(Sei quais foram e também as escolheria)
Levantou seus olhos novamente para mim
e disparou:
- Quem é Manoel de Barros?
(Ri feliz internamente)
Contei para ela quem era.
Ela sorriu e perguntou:
- Eu encontro no google?
Eu disse que sim,
que felizmente sim e
que procurasse por
"poesia de Manoel de Barros"
Ela finalizou:
- Dizem que a gente aprende três coisas novas
todos os dias. Hoje você me ensinou a terceira.
Sorri e não disse nada, ela disse adeus
com um gesto de cabeça e foi embora.
Eu fiquei agradecendo
pela dádiva de poder fazer poesia.

db (05/02/2018)

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

O que é viver

Ter que se doar
em muitos
e não conseguir
Pagar promessas
que não se fez
para santos em que
não se acredita
Se achar um
poço que
transborda
insuficiências
Eis aí o que
é que é viver

db

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Rua que me vive

Esse céu que cobre
Essa nuvem que me faz sombra
Essa chuva que me banha
Esse asfalto que me sustenta
Essa fumaça que me respira
Essa multidão que me empurra
Essa briza que me alivia
Esse barulho que me ensurdece
Essa calçada que me passeia
Esse viaduto que me desaba
Essa esquina que me dobra
Essa é a rua que me vive
db

sábado, 20 de janeiro de 2018

Apesar de tudo (ou Lispectorando o Peito)

A gente vive apesar de
Apesar de, a gente continua
Apesar de, a gente suporta
Apesar da falta de controle
Agente tenta se acalmar
A pesar da falta de resposta
Agente continua a perguntar
Apesar do não entender
É bom ter inteligência
Para ao menos ter
Consciência do que não
se entende
Apesar de, é preciso amar
Apesar de, é preciso conviver
Apesar da ignorância coletiva
É bom nos vacinar
Para ao menos
evitar o contágio
A pesar da escuridão
Existe a lua e o dia seguinte
Apesar da morte existe o antes dela
Apesar da parede há a janela
Apesar do risco
Há a esperança de sucesso
Apesar de, resistimos
Apesar de, respiramos
Apesar da fumaça
Há o espaço
A pesar da tristeza
Há a poesia e a canção
Apesar da sociedade
Há a solidão e a pesar dela
Há o abraço
e a amizade e o coração
Apesar de tudo
E seja como for
O pesar de tudo
É que nos desatina
E aguentar a dor
Apesar da falta de morfina
É o que nos faz viver
É o que a vida nos ensina
db